segunda-feira, 9 de junho de 2014

Iguais? Nem tanto

O que dizer sobre as cotas raciais instituídas no Brasil? O tema, mais uma vez, vem à tona por conta do Projeto de Lei que pretende reservar 20% das vagas de concursos públicos para negros e pardos.

Segundo a Constituição Federal, todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. Não importa a cor da pele, não importa o sexo, não importa a conta bancária. No entanto, na prática, não é bem assim que as coisas funcionam. Para reparar – ou, ao menos, amenizar – o tratamento dado a grupos historicamente desprestigiados, busca-se criar mecanismos para que eles possam ter as mesmas oportunidades que os demais. Procura-se dar aos desiguais um tratamento desigual, para que as diferenças, ao longo do tempo, diminuam.

Se a intenção é boa, o resultado, nem tanto. Ao selecionar grupos específicos para que recebam benefícios, entra-se em um cenário delicado. Como é possível combater o racismo, por exemplo, se as próprias políticas públicas contribuem para que ele aconteça? É preciso bom senso. Até porque, ao separar a sociedade em grupos, sempre haverá os que se sentem menos prestigiados. Então, será que a todos esses seriam dadas regalias específicas?

Não acho lógico usar o argumento de dívida histórica com os negros por conta da escravidão para concorrência de cotas. Até porque, se for usado o mesmo argumento, teriam que ser concedidas cotas às mulheres, por conta de sempre estarem submetidas à vontade do homem ao longo da história. E, quem sabe, dar os mesmos privilégios aos homossexuais, que sempre sofreram escancarado preconceito... creio que não é por aí que as coisas devem caminhar.

As cotas raciais para o acesso à universidade e, agora, para concursos públicos, cria, na população, um sentimento de revolta. Dá a ideia de que, quem não tem a cor da pele preta, é mais inteligente do que quem tem. O que não tem a mínima base de verdade. Não é a cor da pele que vai indicar a capacidade intelectual, nem força de vontade, muito menos até qual degrau de sucesso profissional uma pessoa pode chegar.

O que a cor da pele interfere? Nada. Absolutamente nada. Vai me dizer que o filho do ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa tem menos chances de ingressar em uma universidade, ou em um cargo público, por meio de concurso, do que um filho de nordestino, pobre, que trabalha o mês todo para ganhar um salário mínimo para o sustento da família? Creio que não.

Qual é a lógica? Como eu posso lutar contra o racismo, se o próprio sistema contribui para que ele aconteça? Ou vai dizer que as pessoas de fora desse grupo não se sentem menosprezadas? Cotas raciais privilegiam apenas um grupo, sem justificativa. Diferentemente das cotas sociais. Se a intenção é dar oportunidade a quem não teria chance de outra forma, que dê a quem é menos favorecido economicamente. Afinal, nem todo negro é pobre, e nem todo branco é rico. E, olha só, ao estimular as cotas sociais, automaticamente os brasileiros negros são incluídos, já que cerca de 70% dos negros são pobres.

É grave separar a população entre negros e não-negros. Ao cometer isso, todo o discurso de igualdade vai para o ralo, e as consequências podem ser perigosas. Já tivemos casos bisonhos no Brasil por conta dessa ‘seleção racial’ para cotas. Há alguns anos a Universidade de Brasília (UnB) julgou gêmeos idênticos de forma distinta. Um foi considerado negro, o outro não. Duas pessoas que nasceram e cresceram no mesmo ambiente, recebendo a mesma educação e oportunidades, mas o critério de seleção simplesmente pela cor traçou destino diferente para os dois (após recurso, a universidade avaliou o julgamento errado e também admitiu o outro irmão).

É preciso dar educação de qualidade para todos, negros ou não. É preciso dar oportunidades para todos, negros ou não. É preciso incluir todos na sociedade, negros ou não. Afinal, somos todos iguais, negros ou não. Não é pela cor da pele que eu vou julgar uma pessoa. É preciso trabalhar para consertar os erros, e não criar mecanismos para maquiá-los.