O que dizer sobre as cotas
raciais instituídas no Brasil? O tema, mais uma vez, vem à tona por conta do
Projeto de Lei que pretende reservar 20% das vagas de concursos públicos para negros
e pardos.
Segundo a Constituição Federal, todos são iguais perante a lei,
sem distinção de qualquer natureza. Não importa a cor da pele, não
importa o sexo, não importa a conta bancária. No entanto, na prática, não é bem
assim que as coisas funcionam. Para reparar – ou, ao menos, amenizar – o
tratamento dado a grupos historicamente desprestigiados, busca-se criar
mecanismos para que eles possam ter as mesmas oportunidades que os demais.
Procura-se dar aos desiguais um tratamento desigual, para que as diferenças, ao
longo do tempo, diminuam.
Se a intenção é boa, o resultado,
nem tanto. Ao selecionar grupos específicos para que recebam benefícios, entra-se
em um cenário delicado. Como é possível combater o racismo, por exemplo, se as
próprias políticas públicas contribuem para que ele aconteça? É preciso bom
senso. Até porque, ao separar a sociedade em grupos, sempre haverá os que se
sentem menos prestigiados. Então, será que a todos esses seriam dadas regalias
específicas?
Não acho lógico usar o argumento
de dívida histórica com os negros por conta da escravidão para concorrência de
cotas. Até porque, se for usado o mesmo argumento, teriam que ser concedidas
cotas às mulheres, por conta de sempre estarem submetidas à vontade do homem ao
longo da história. E, quem sabe, dar os mesmos privilégios aos homossexuais,
que sempre sofreram escancarado preconceito... creio que não é por aí que as
coisas devem caminhar.
As cotas raciais para o acesso à
universidade e, agora, para concursos públicos, cria, na população, um
sentimento de revolta. Dá a ideia de que, quem não tem a cor da pele preta, é
mais inteligente do que quem tem. O que não tem a mínima base de verdade. Não é
a cor da pele que vai indicar a capacidade intelectual, nem força de vontade,
muito menos até qual degrau de sucesso profissional uma pessoa pode chegar.
O que a cor da pele interfere?
Nada. Absolutamente nada. Vai me dizer que o filho do ministro do Supremo
Tribunal Federal Joaquim Barbosa tem menos chances de ingressar em uma
universidade, ou em um cargo público, por meio de concurso, do que um filho de
nordestino, pobre, que trabalha o mês todo para ganhar um salário mínimo para o
sustento da família? Creio que não.
Qual é a lógica? Como eu posso
lutar contra o racismo, se o próprio sistema contribui para que ele aconteça?
Ou vai dizer que as pessoas de fora desse grupo não se sentem menosprezadas? Cotas
raciais privilegiam apenas um grupo, sem justificativa. Diferentemente das
cotas sociais. Se a intenção é dar oportunidade a quem não teria chance de
outra forma, que dê a quem é menos favorecido economicamente. Afinal, nem todo negro
é pobre, e nem todo branco é rico. E, olha só, ao estimular as cotas sociais,
automaticamente os brasileiros negros são incluídos, já que cerca de 70% dos
negros são pobres.
É grave separar a população entre negros e não-negros. Ao
cometer isso, todo o discurso de igualdade vai para o ralo, e as consequências
podem ser perigosas. Já tivemos casos bisonhos no Brasil por conta dessa
‘seleção racial’ para cotas. Há alguns anos a Universidade
de Brasília (UnB) julgou gêmeos idênticos de forma distinta. Um foi considerado
negro, o outro não. Duas pessoas que nasceram e cresceram no mesmo ambiente,
recebendo a mesma educação e oportunidades, mas o critério de seleção
simplesmente pela cor traçou destino diferente para os dois (após recurso, a
universidade avaliou o julgamento errado e também admitiu o outro irmão).